segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Cliente Interno

Quando uma empresa pública ou privada fala em agradar ao cliente, em tê-lo como um bem precioso que necessita de atenção especial leva-se em consideração, apenas, o cliente externo, aquele que adquire os produtos e/ou serviços. Têm toda razão em criar mecanismos para melhor atender às necessidades e anseios daquele que é a razão de ser de suas existências. Porém, pouco se discute a questão do cliente interno. Quem seria? Quem é esta figura da qual pouco se fala? È aquele que depende do trabalho de outrem para que o seu seja efetuado com eficiência e eficácia. Uma equipe é formada por componentes aonde as atribuições de cada um devem formar um todo. Antes de se tomar qualquer atitude todo e qualquer funcionário deve analisar de que forma essa medida poderia afetar os afazeres de seu colega, seu cliente interno. No setor público, em particular, esse procedimento não é tido como importante por alguns servidores. Aproveitam-se da permissividade dos gestores ao estabelecer horários próprios de permanência nas repartições, impedindo assim, o fluxo normal dos serviços que deveriam ser executados. Em qualquer ambiente em que não haja comprometimento e diálogo problemas como esses podem surgir. Cabe aos dirigentes ficarem alertas e tomarem as devidas providências com rapidez, antes que tal procedimento contamine todo o funcionalismo.

“Que país é esse?”

Pessoas que criticam — com toda razão — políticos que não administram bem o Erário público quando se vêem em situações semelhantes agem da mesma forma; policiais são taxados como corruptos, mas muitos indivíduos que assim os classificam não vacilam em oferecer propinas para que seus veículos não sejam fiscalizados com rigor; muitos servidores públicos, de setores estratégicos, só agilizam processos se lhes “molham” a mão, ou seja, cobram certos valores extras aos requerentes para dar continuidade aos trabalhos pelos quais já são pagos; quem procura atendimento em hospitais públicos, por vezes, só conseguem se antes passarem por um político que alimenta um mercado de troca de favores; adolescentes infratores roubam, matam e quando lhes é perguntado o porquê de agirem dessa maneira, respondem: “pra menor, não dá nada, três anos passa rápido”; adultos roubam, matam, mas se puderem pagar um bom advogado não se consegue colocá-los na cadeia devido às brechas no sistema penal brasileiro; quando um juiz comete algo ilícito tem como punição a aposentadoria compulsória; bancos acumulam lucros astronômicos tarifando tudo que lhes convier e quiser. Todas essas situações retratam um país falido moral, ética e socialmente. O Brasil tem tudo para se tornar uma grande nação, próspera e mais igualitária, porém há de se investir maciçamente em educação. Fala-se em fortalecer as instituições, contudo esquecem que são os homens quem as criam e administram.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O Brasil da Copa

Li na internet (http://colunistas.ig.com.br/guilhermebarros/2010/08/27/odebrecht-tera-financiamento-do-bndes-e-isencao-fiscal-na-construcao-do-estadio-do-corinthians/ ) que Lula, ele mesmo, o nosso presidente teria sido o principal articulador do projeto de construção do estádio do Corinthians pela empresa Odebrecht para que o mesmo seja sede da Copa de 2014, inclusive com a possibilidade de promover o jogo de abertura. Até que ponto isso poderia ser considerado normal? A construtora utilizaria financiamento do BNDES, ou seja, dinheiro público.
Apesar de não parecer ilegal, há, no entanto, uma impressão de cartas marcadas. O gestor do “Timão” foi o Chefe da delegação da Confederação Brasileira de Futebol - CBF que participou da Copa do Mundo na África do Sul e a candidatura do Estádio do Morumbi, pertencente ao time do São Paulo, já havia sido impugnada pelo Comitê da Copa que tem como membro, o presidente da CBF, o senhor Ricardo Teixeira.
Para piorar as coisas o Lula parece utilizar-se do prestígio presidencial para ajudar o seu time do coração.
A Copa do Mundo no Brasil, por si só, já traz uma desconfiança de que possa ocorrer tráfico de influência, corrupção e que muito dinheiro público poderá encher os bolsos de muita gente, de maneira ilegal, e fatos como os citados acima só reafirmam que o receio é legítimo.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Conto XIV

Noite Sombria 


Uma neblina intensa cobria a cidade. Ninguém em sã consciência deveria andar por aquelas ruas. Havia boatos de que um maníaco atacava as pessoas com uma navalha. Entretanto o dever me chamava. Trabalhava como garçom numa casa noturna e não tinha muita escolha.


Naquela noite passei por uma experiência incrível e perigosa. Estava servindo às mesas quando um homem muito estranho entrou no bar. Ele era muito alto. Deveria ter quase dois metros. Vestia-se de preto. Fui servi-lo. 


— Pois não, senhor! Em que posso... — Traga-me um conhaque — interrompeu-me bruscamente. 


— É claro, só um instante. — respondi. 


Fui pegar sua bebida, mas não antes de perceber uma tatuagem em sua mão direita. Era uma caveira com flores ao redor. Aquilo me deu calafrios. O bar estava cheio, contudo aquela figura chamava a atenção. Ele não demorou muito. Saiu logo após tomar seu terceiro drinque. Foi aí que cometi meu grande erro do dia. Resolvi segui-lo. 


— Aonde você pensa que vai? — perguntou o meu colega. — Agüenta as pontas aí, eu já volto! 


Imaginei, naquele individuo, a figura do tal maníaco que haviam falado. Fui atrás dele. Ficava numa distância de, mais ou menos, vinte metros para que não percebesse que o estava seguindo. Suas passadas eram largas e tive que correr em alguns momentos. Enfim, ele parou. Estávamos numa rua praticamente vazia. Fiquei escondido numa das esquinas. Apenas ele, eu e um par de gatos pretos insistíamos em permanecer ali. O silencio reinava. Ele parecia estar esperando alguém. O tempo passava e o meu medo era ainda maior, porém continuava vigilante e determinado a elucidar aquele mistério. Vinte minutos se passaram. Eu já estava desistindo, pois tinha que voltar ao trabalho. Até que uma mulher aparece caminhando em direção àquele senhor sinistro. Não sabia o que fazer. Tentei avisá-la do perigo que ela correria se desse mais alguns passos, quando meu telefone celular tocou. Era meu colega garçom. Atendi rapidamente, torcendo para que o “malfeitor” também não tivesse ouvido.


— Cadê você? O patrão ta louco da vida contigo! — Não posso falar agora. Tchau! 


Tarde demais. O “maníaco” estava na minha frente. Não sabia se eu corria, rezava ou até mesmo se chorava. Minhas pernas tremiam. O coração quase sai pela boca. 


— Você é o cara do bar! Por acaso estava me seguindo? — Eu... Eu... Não! Não! 


Quando pensei que seria retalhado e jogado aos cães, ouvi uma linda voz perguntando:


— Algum problema papai?


Fiquei surpreso.


— Papai? — perguntei.


— Sim! Essa é minha filha e aquela é a minha casa. Eu aguardo a minha Suzana chegar da faculdade aqui todos os dias. Essa rua é muito deserta e com esses boatos de maníaco solto por aí... 


— Por favor, me desculpe! Eu e minha imaginação fértil. Deixei-me levar pelas aparências e achei que o senhor poderia ser esse louco.


— Suma daqui! — disse-me. 


Estava indo embora quando percebi que aquele homem deixara cair algum objeto. Fui pegá-lo. Poderia diminuir meu constrangimento devolvendo-lhe algo que havia perdido, pensei. Só fui saber de que artefato se tratava quando o peguei nas mãos. Uma navalha!

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Conto XIII

Apenas, um dia!


Acordo! Faço minha higiene pessoal, tomo café e troco de roupa para ir trabalhar. Ao ligar o carro observo que o combustível está na reserva. Que chato! Terei que desembolsar alguns trocados com gasolina.


No caminho tenho que desviar de buracos na pista. O sinal vermelho de um semáforo faz com que eu pare. Nem todo mundo age da mesma maneira. Muitos invadem. Que povo mal educado!


— Filho da p... — esbravejou, revoltado, um motorista que fora fechado por um outro veículo.


Meu mundo fica verde e volto a seguir a minha jornada. É cedo e a cidade ainda não despertou por completo. Vejo moradores de rua dormindo em calçadas tendo como colchões pedaços de papelão. Vida ingrata! Enfim, chego ao trabalho. 


— Bom dia! — Bom dia seu Carlos! Como vai? — indaga-me o vigia da empresa.


— Muito bem, obrigado! 


Abro a sala do escritório e visualizo minha poltrona. Ela é grande, preta, bem acolchoada. Confortável. Porque será que reparei na minha poltrona? Hora de trabalhar. Ligo o computador. Ler minhas mensagens é a minha primeira tarefa do dia. Mas eu não disse que era hora de trabalhar? Nada disso. Inicialmente verifico os “e-mails” e leio os jornais. È assim todos os dias. 


Depois de muita correria, discussões, erros e acertos, é hora do almoço. Nem sempre consigo ir almoçar em casa. Hoje é um desses dias. Comerei uma pizza na pastelaria da esquina. Se não fosse pelo trabalho tomaria uma taça de vinho. Peço uma pizza pequena de mussarela, minha preferida. A garçonete me diz que talvez demore um pouco, pois há muitos pedidos. Disse isso com um belo sorriso. Fiquei encantado por ela. Nunca a tinha visto trabalhando ali. Tinha um belo corpo, cabelos compridos. Loiros.


— Já estou trazendo sua pizza! Não quer beber nada? — perguntou-me a linda garçonete. 


Fiz um gesto com a cabeça demonstrando que não iria beber nada e agradeci. Os minutos se passavam e nada de pizza. Comecei a ficar incomodado. Irritado. Nem aquele sorriso que tanto admirei fez com que eu me acalmasse. Detesto esperar. Enfim, quinze minutos depois chega a minha vez. Ela chegou. Refiro-me à pizza. Tinha apenas trinta minutos para devorá-la.


— Queimada! — gritei, após experimentar o primeiro pedaço — a minha pizza está queimada! 


— Desculpe-me senhor eu trarei outra. — disse-me a garçonete, constrangida. 


— Pra esperar mais quanto tempo? Esquece! Perdi o apetite. 


Saí da pastelaria com fome e indignado.


— Como foi o almoço? — perguntou-me o vigia da empresa


Fiz uma cara feia e nada respondi. Fiquei emburrado o resto do dia. Qualquer coisa me tirava do sério. Seis horas da tarde. Liberdade! Volto pra casa. Era dia de academia, mas só penso em compensar minha dieta forçada do almoço preparando uma bela macarronada e tomando todo o vinho que tiver vontade. Ouço um barulho. O carro insiste em ir para o lado direito. Estaciono e vou verificar o que aconteceu. Pneu furado. Imaginei o que mais de ruim poderia acontecer. 


— Onde está o estepe? — gritei desesperado - Roubaram meu pneu! 


Cai na gargalhada. Tive uma crise de riso que parecia não ter fim. Eu ria da minha própria desgraça. Depois de resolvido o problema, chego a minha casa, exausto. Deixo a ideia de macarronada de lado e me contento com um pedaço de bolo e um copo de suco que estava na geladeira. Procuro um filme na televisão. Pego no sono.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Conto XII

Fio de Esperança

– “O Sertanejo é antes de tudo um forte!”. Quem foi que disse isso mermo?

– Eu sei lá quem disse isso homi, ta variando?

– Eu tô falando sério! Um poeta disse isso, só não lembro o nome do danado.

– E porque ele disse isso, José?

– Sei lá, ele deve de ter procurado passarinho pra caçar e pra não voltar de mãos vazias apareceu com um calango do mato ou pode ter visto a criação morrer de fome e de sede no quintal de casa. De repente ele já chorou depois de ouvir os filhos pedindo por comida, quem sabe? O que eu sei é que a gente nasce, vive e morre lutando. Lutando por um cadim de comida, uma cama macia, um cobertor pra fugir do frio, um teto pra proteger nóis da chuva e do sol.

– É isso mermo! – concordou Maria.

José, Maria e seus dois filhos estavam alojados na quadra de esportes de um colégio, pois sua casa havia sido destruída pelas águas do açude que, depois de ter quebrado a represa devido às fortes chuvas, invadiram o pequeno povoado onde dezenas de famílias foram atingidas. A situação era crítica e os desabrigados tinham que contar com a solidariedade de outras pessoas.

– Aposto que esse poeta num sabe o que é perder sua casa e sua plantação! – resmungou Maria.

– Maria, eu acho que ele quis dizer é que pra tudo tem um jeito, e se não tem, o sertanejo arruma. Quantas vezes a gente passou fome? Lembra daquela vez que a gente deu farinha com açúcar pras crianças por três dias seguidos? A gente continua vivo, num continua?

– Eu num entendo José, a gente passa um aperto daqueles pra plantar arguma coisa e a chuva num vem, até rezar nóis reza e nada. Agora, vem esse mundo de água e derruba nossa casa e estraga nossa plantação. Isso é justo?

– As coisa de Deus nós num discute mulé, pode até lamentar, mas num discute!

– Pai, mãe eu tô com fome! – disse o filho mais novo ao acordar

José e Maria se olharam, procuraram a sua volta e nada tinham a oferecer à criança.

– Dorme meu filho, dorme! – disse José, desconsolado.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Conto XI

Inesquecível

Lembro-me do meu último presente de criança que meu pai me deu no natal de 1980. Era um domingo e logo cedo todos se preparavam para ir à igreja. Nesse dia eu havia dormido na sala, pois tínhamos visitas. Meu tio Carlos e meus primos vieram festejar conosco a data natalina. Tio Carlinhos, como eu o chamava, era um homem alto, cabelos grisalhos, um bigode enorme que lhe cobria a boca. Ele era engraçado! Seus filhos eram duas pestes! Juan tinha mania de chutar canelas e puxar nossos cabelos. Aos doze anos ainda não sabia escrever direito e vivia de castigo. O filho mais velho de meu tio era o Joaquim que tinha, se me lembro bem, uns quinze anos. Achava-se o tal! Vaidoso, demorava duas horas no banheiro para tomar banho. Não nos dávamos muito bem, pois como ele era mais velho que eu gostava de me dar cascudos sem motivo algum. Ele só não era páreo para meu amigo Nestor.

A amizade entre Nestor e eu era fora do comum! Fomos criados juntos desde os dois anos de idade e nossas mães eram comadres. Pelo menos se tratavam assim. Era comadre pra lá, comadre pra cá!

Eu já ia esquecendo, tava falando do brinquedo que meu pai me dera. Era um carro de plástico. Um carro desses de corrida, eu não sei qual era a marca. Se não fosse pelo tamanho todo mundo diria que era de verdade. Fiquei apaixonado logo de cara e agradeci ao meu pai pulando e agarrando-me em seu pescoço. Estava muito feliz!

– Obrigado meu pai! Obrigado!

– Não foi nada meu filho, que bom que você gostou!

Depois de agradecer ao “meu velho” fui ao encontro de Nestor para lhe mostrar o lindo presente que havia ganhado. Nem me lembrei de meus primos. Nestor e eu tínhamos a mesma idade e gostos bem parecidos. Não sei quem foi influenciado por quem. A diferença entre nós era apenas no tamanho. Nestor era um “monstrinho”! Desenvolveu-se muito rápido e aos doze anos já tinha a mesma altura que seu pai, que não era pequeno.

– Nestor, olha o que eu ganhei! Olha só, olha! – gritei quase sem fôlego.

– Calma cara!

– Veja isso! Não é uma beleza? – perguntei-lhe

Nestor sorriu e me pediu para dar uma volta com meu carro. Apesar de eu mesmo ainda não ter colocado meu carrinho no chão era o meu melhor amigo quem tava pedindo. Não vacilei.

– Claro cara! Pega um barbante e vamos amarrar aqui na frente!

Apesar do tamanho Nestor era um moleque que gostava de brincar como qualquer outro. Ao sair de sua casa com um barbante na mão vi a dimensão de sua alegria. Parecia ainda mais alegre que eu. Estávamos amarrando o carro para que pudéssemos puxá-lo quando minha mãe me gritou:

– Filho, o que você está fazendo?

– Estou brincando com o Nestor, estamos inaugurando meu carro novo!

– Está bem, mas não demore pro almoço!

Amarramos o barbante e Nestor saiu a toda velocidade com meu possante. Tudo ia bem até que fiquei com vontade de aproveitar o meu brinquedo.

– Nestor, agora é minha vez!

– Agora não! – respondeu ele.

– Como não? O carro é meu, ta?

Ao ouvir essa minha frase, Nestor parou repentinamente e com um olhar frio devolveu-me o carro sem dizer uma só palavra indo embora para sua casa.

– Ele exagerou, ele exagerou! – repeti comigo mesmo.

Diante do que havia acontecido voltei para a minha casa e fui tomar banho para o almoço. Minha mãe estava na cozinha, de tão agoniada nem me viu passar. Deixei meu brinquedo na varanda, tomei meu banho, troquei de roupa e fui à sala. Meu pai e meu tio assistiam ao futebol. Não sabia onde estavam meus primos. Logo após o almoço fui para meu quarto fazer a lição de casa, alguns exercícios que a minha professora tinha passado. Logo anoiteceu.

De tão cansado acabei adormecendo, só despertando pela manha e depois de um terrível pesadelo. Sonhei estar circulando com meu carrinho pelas ruas da cidade até que um garoto de outra rua tomava meu brinquedo das minhas mãos e saia cantarolando:

– Tomei o brinquedo de um otário! Tomei o brinquedo de um otário!

Foi horrível! Levantei que nem um louco e fui olhar se minha maravilha de quatro rodas ainda estava onde eu havia deixado.

– Ué! Cadê meu carro? – gritei.

Corri de um lado pro outro procurando, olhei embaixo dos móveis, no quintal e nada. Estava trêmulo, nervoso e comecei a chorar. Num instante veio em minha mente o dia anterior. Lembrei do quanto Nestor havia ficado chateado comigo. Pensamentos ruins vieram à minha cabeça.

– Será que foi o Nestor? – pensei em voz alta.

Nunca imaginei desconfiar do meu melhor amigo, mas isso martelava na minha mente. Não conseguia pensar em outra coisa, então resolvi procurá-lo.

– E aí cara, onde ta meu carro?

– Porque ta me perguntando? Depois de me humilhar, agora ta me chamando de ladrão?

Nestor se aproximou de mim e com uma força absurda acertou o meu queixo com um soco. Parecia que um cavalo havia me dado um coice. Voltei pra minha casa com a certeza de ter perdido meu melhor amigo. Assim que cheguei encontrei meu pai que foi me perguntando:

– Que cara é essa, meu filho?

– Meu carro sumiu! – respondi

– Não sumiu, não! ­– disse meu pai – seu tio foi embora hoje cedo muito envergonhado depois de devolver o seu brinquedo que Juan escondeu em uma das malas.

– Que droga! – retruquei

– Não gostou de ter seu brinquedo de volta?

– Não é isso, é que eu desconfiei do Nestor. Ele nunca vai me perdoar.

No outro dia, todo encabulado, fui à casa do Nestor, contei tudo que havia acontecido e lhe pedi desculpas. Ele me ouviu atentamente, olhou-me fixamente e veio em minha direção. Fechei os olhos esperando outro soco. Nem pensei em correr, eu tava merecendo. Em vez de um nocaute ganhei um grande abraço.

– Deixa de besteira meu amigo! – disse-me Nestor – vamos brincar!

terça-feira, 20 de abril de 2010

Conto X

Em cada canto um encanto!

Há seis anos resolvi fazer uma viagem sem destino certo. Parei numa cidadezinha próxima a Salvador devido a um problema mecânico no carro em que eu estava e tive uma grande surpresa. A cidade a que me refiro era, realmente, muito pequena. Tinha uma pracinha bem arborizada, casas modestas e uma singela igreja branca com portas azuis. O defeito no veículo não era tão simples e o conserto demoraria pelo menos ate o dia seguinte, por isso fui a um barzinho beber alguma coisa e relaxar um pouco.

– Uma cerveja, por favor!

– Qualquer uma? – perguntou o dono do bar

– Uma que esteja bem gelada, de preferência. – respondi.

Sentei-me numa das cadeiras do lado de fora do bar e comecei a beliscar uns salgadinhos quando vi uma morena linda passeando pela praça. Parecia uma deusa! Tinha os cabelos enrolados, corpo escultural, magro, mas com curvas sinuosas. Nesse momento eu não via e nem ouvia mais nada. Minha atenção era toda daquela formosura que era uma mistura de mulher e menina. Ao passar por mim ela me olhou. Aproveitei e fiz sinal com o copo, rendendo-lhe homenagem e, ao mesmo tempo, convidando-lhe a sentar à minha mesa. Ela sorriu! Andou mais alguns passos, parou e voltou em minha direção.

– Você me conhece?

– Não, mas adoraria conhecê-la – respondi – não quer sentar e conversar um pouco?

– Tudo bem, mas não vá pensando besteiras.

Ela sentou e começamos a conversar. Havia nascido nesta mesma cidade e pouco saia de lá. Morava com seus pais e tinha o sonho de fazer um curso de enfermagem, mas para isso teria que se deslocar para uma cidade maior, algo que ainda não era possível. Fui mais ousado e perguntei se tinha namorado.

– Vou embora, você já ta com segundas intenções

– Calma! Foi só uma pergunta e se não quiser responder, tudo bem.

– Ta, mais olha lá, viu? – ela retrucou, com cara de brava – eu tenho “ficante”

Fiz-me de bobo e perguntei:

– O que é um “ficante”?

– É um quase namorado – Disse-me com um lindo sorriso.

Ela, parecendo confiar mais em mim, começou a falar de sua vida sofrida, apesar de sua pouca idade. Contou-me de seus conflitos com sua mãe.

– Eu odeio ela! Ela me maltrata.

– Mas por quê? – perguntei

– Sei lá, ela nunca gostou de mim.

Percebendo sua tristeza tentei mudar de assunto, mas antes disso, sua mãe veio como uma doida e a puxou pelos cabelos, fazendo o maior escândalo. Fiquei sem saber o que fazer enquanto as duas sumiam por uma das vielas da cidade. Paguei a cerveja e saí à procura de um lugar para passar a noite, mas não tirava aquela menina da cabeça.

– Será que nunca mais a verei – pensei em voz alta.

Noutro dia, ao sair da pensão, dei de cara com ela, cabisbaixa.

– Não agüento mais, eu só quero ser feliz – disse-me ao me abraçar – me deixa ir com você! Me leva!

Fiquei um pouco perturbado com o seu abraço e com o que ela me pediu. Tentei lhe explicar que esse não era o melhor caminho, que deveria estudar fazer o seu curso e tentar, de alguma maneira, se entender com sua mãe. Infelizmente ela não meu deu ouvidos e saiu, aos prantos, dizendo:

– Eu não posso contar com ninguém mesmo!

Voltei pra minha cidade. Nunca mais a tinha visto até que no mês passado fui convidado para uma cerimônia de formatura de uma amiga. Aceitei ao convite, apesar de achar uma chatice. Nem sabia qual era o curso dos formandos e para minha grata surpresa eis que vejo aquela morena linda recebendo das mãos de sua mãe o diploma de formatura do Curso de Enfermagem. Ela admirou-se a me ver, mas se aproximou e disse com um sorriso largo:

– Pensei bem no que você me disse da ultima vez em que nos falamos e resolvi seguir seu conselho, obrigado!

Abraçou-me e se foi.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Conto IX

TUDO COMO DANTES...

Numa ilha muito distante, bem no meio do Pacífico, existia um reino. O Reino dos Acomodados. Tudo ia bem até que um belo dia um grave problema abalou as estruturas do reinado. Foi o maior alvoroço. Todos comentavam o desfalque ocorrido. A Rainha teria desviado uma boa quantia em dinheiro que era destinado ao pagamento de fornecedores.

– Isso é caso de polícia! – indagou um dos membros da população – Temos que recorrer à polícia, além das medidas internas de averiguação e punição.

Houve quem discordasse, quem achasse que não era para tanto.

– Coitada! – disseram – Ela tava devendo a agiotas e precisou pegar o dinheiro, mas vai devolver.

– Coitada? Foi isso mesmo que eu ouvi? – gritou, a mesma pessoa que havia sugerido a intervenção policial, indignado – Eu sempre solicitei a prestação de contas e só ouvia desculpas esfarrapadas, mentiam dizendo que estava tudo bem e que tudo seria esclarecido. Aí está o resultado!

Além da rainha a Comunidade era dirigida por mais três integrantes que dividiam, entre si, as tarefas administrativas com a ajuda de uma assistente. O pagamento aos fornecedores deveria ser feito por meio de cheques e nestes deveria constar duas assinaturas para melhor controle, a da rainha e a do secretário do tesouro. Porém, isso não foi o bastante para impedir que metessem a mão no dinheiro. Houve quem admitisse o erro, quem tirasse o corpo fora, quem colocasse a culpa um nos outros, mas tudo ficou impune. Praticamente sem maiores conseqüências para a rainha e seus colaboradores, apesar de algumas reuniões dos membros da comunidade para discutir o assunto e de uma inevitável intervenção.

 – E agora? – perguntaram.

– Agora temos que aprender a lição. A rainha tem que ser destituída e processada, assim como os demais membros da cúpula e alguém, que zele pela nossa comunidade e que preste contas de seus atos, deve entrar em seu lugar. Vamos cobrar! Tudo será diferente!

Ninguém queria assumir o reinado diante de tantos problemas. Apenas um membro aceitou a indicação. Inclusive, dizia ele, que também cobrava da administração anterior a devida prestação de contas. E assim aconteceu. Um novo rei surgiu, mas os problemas não desapareceram. Depois de um longo período e graças à venda de terras pertencentes à comunidade as dívidas foram pagas. Os fornecedores se viram obrigados a receber o que lhes foi oferecido numa negociação em que os valores originais foram diminuídos. A prestação de contas não foi feita até então, mesmo depois de passados alguns anos. E a população, fazendo jus ao nome do reino, continua acomodada. Não reclama. Exceção àquela voz que, de maneira isolada e corajosa, ainda clama por transparência.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Conto VIII

Sentimento!

Maura estava feliz da vida! Enfim havia conseguido engravidar depois de inúmeras tentativas e de um tratamento especial. Ao saber da notícia, após ter feito um teste daqueles comprados em farmácias, ligou para sua melhor amiga:

– Eu vou ter um filho! Eu vou ter um filho!

– Que legal Maura! – disse sua amiga Jenifer – Lembre-se de fazer todos os exames!

– É claro, amiga! Eu sei disso.

A felicidade era tanta que Maura nem esperou o marido voltar pra casa. Foi ao seu trabalho contar a novidade.

– Querido eu tenho uma coisa pra te contar!

– Fala amor, o que foi que houve?

– Sabe uma coisa que a gente queria muito que acontecesse, mas tava demorando demais?

– Você quer dizer que... É sério? Vamos ter um filho?

Maura acenou que sim com a cabeça e com um sorriso largo no rosto. Os dois pularam de alegria e depois de muitos beijos e abraços Henrique perguntou:

– Como você soube? Não me disse que iria ao médico.

– Eu não fui! – respondeu Maura – Fiz um teste daqueles testes de farmácia, mas eu já estava desconfiada devido aos enjôos.

– Temos que ir ao médico, Maura!

– Eu sei meu amor, a Jenifer disse a mesma coisa. Nós vamos amanhã mesmo, está bem?

– Ok! Vou pedir uma folga na Repartição.

No outro dia foram ao médico que solicitou alguns exames. Após uma semana Maura retornou sozinha à clínica para saber os resultados.

– Olá doutor!

– Como vai Dona Maura? Sente-se, por favor! A gente precisa conversar um pouco.

– Algum problema doutor?

– Dona Maura, depois de analisar os exames eu sinto em dizer que seu filho nascerá com a Síndrome de Down!

– Como é? O que o senhor disse?

– Essa doença... – o médico tentava explicar quando foi interrompido.

– Eu sei o que é essa doença doutor! – esbravejou Maura aos prantos – O senhor está errado, não pode ser! Não pode ser!

– Dona Maura, se essa criança tiver amor e carinho, um tratamento precoce e um esforço maior em sua educação ela será quase tão normal quanto qualquer outra.

Maura saiu atordoada da clínica. Desorientada, saiu pelas ruas tentando entender o que estava acontecendo.

– “Eu terei um filho retardado!” – pensou.

Vendo a angústia no semblante de Maura, uma mulher de boa aparência pergunta-lhe:

– Com licença! Posso te ajudar? Parece estar com problemas.

– Problemas, eu? Imagina! Eu estou ótima! Sempre quis ter um filho e agora que consegui engravidar descubro que ele nascerá retardado. Eu não tenho problema nenhum! – ironizou. – Quem é você? Eu nem te conheço!

– É verdade! Mas saiba que sei muito bem o que está sentindo.

– Como pode saber? – indagou Maura. – Tem um filho com Síndrome de Down?

– Não, mas tenho um filho que tem AIDS! – retrucou – Soube que ele nasceria com a doença logo cedo, nos primeiros exames. Foi aí que soube que eu estava contaminada também. Chorei muito. Culpei-me, pois fui eu quem compartilhou seringas por conta do vício. Pensei até em fazer um aborto.

– E por que não fez?

– Eu não sei! Desisti na porta da clínica onde tiraria o bebê. Um sentimento de mãe tomou conta de mim e não me arrependo por ter mudado de idéia. Hoje, apesar da doença, meu filho é uma criança linda que me dá muito orgulho. Sou feliz! Vivo intensamente cada momento da minha vida ou o que resta dela com o meu filho.

Ao ouvir o depoimento daquela desconhecida, Maura refletiu bastante, enxugou as lágrimas e chegou à conclusão que não adiantaria nada se lamentar. Voltou para casa e contou tudo ao seu marido. Oito meses depois eu nasci! Tenho minhas limitações, é verdade, mas sou um garoto feliz. Tenho uma família que me ama e me respeita do jeito que eu sou.

Círculo Vicioso

O círculo vicioso alimentado, de parte à parte, entre políticos e eleitores, destrói qualquer possibilidade de mudanças significativas no at...